"Quem quiser reformar o mundo comece por si mesmo."

Santo Inácio de Loyola

A casa comum pela mística da Encarnação

A vinda do filho de Deus, concebido por uma mulher chamada Maria e nascido no meio dos pobres, nos coloca na plenitude da história humana em que “o verbo se fez carne, e habitou entre nós” (Jo, 1,14). Este feito universal, pertencente a todos os povos, transmite a beleza do amor de Deus por toda a sua criação,– vindo resgatar a dignidade humana, mas também a plenitude presente da vida presente em toda a Sua criação. Como afirma São João: “Deus é amor” (I Jo 4,8); e não há dignidade humana sem a preservação, por amor, de toda a Criação. O catecismo da Igreja Católica expressa que “A verdade da criação é tão importante para toda a vida humana que Deus em sua ternura, quis revelar a seu Povo tudo o que é salutar que se conheça a esse respeito” (CIC, 287). As vezes, caímos no erro de desassociar a vida humana da criação, da ecologia, do bem e da nossa casa comum. Um erro grave, cometido até por homens da fé. Contudo, como diz a música “Tudo está interligado”, de Pe. Cireneu Kuhn, SVD:

“Tudo está interligado
como se fôssemos um,
tudo está interligado
nessa casa comum”.

Devemos, então, nos perguntar: como estamos vivendo a virtude da criação? Como está o nosso cuidado pessoal, o cuidado com as outras pessoas, o cuidado com toda a criação de Deus, quando percebemos que o Cristo da Vida está presente em nosso meio?

Pecado social gera a crise ecológica

Cotidianamente nos deparamos com o pensamento de poder e as ações predatórias do ser humano, que explora os recursos naturais sem a menor consciência da vida em nosso planeta, causando, assim, a degradação do meio ambiente, o êxodo de milhões de pessoas, bem como a pobreza, a morte. Vemos nossas cidades poluídas visualmente, frias e longe do que o ser humano necessita para viver bem. Tudo é reflexo da vida desordenada a que nos acostumamos viver.
A desordem se origina em nossos pecados individuais que se somam a desordem do pecado de outras pessoas e se torna uma “bola de neve”. Essa involução é o que chamamos de pecado social e que explica as grandes crises no mundo, entre elas a da ecológica.
Devemos olhar para e discernir individual e coletivamente o todo e o planeta como parte do Reino de Deus. O na afirmação do Evangelho “O reino de Deus está no meio de nós” (Lc 17, 21). Um reino que Jesus inaugurou e disse: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10). Ora, o que é a vida, senão viver em Cristo? E o que é viver em Cristo sem abraçar a vida em sua totalidade, sabendo que dela faz parte o todo existente no planeta?

O amor consiste mais em obras do que em palavras

Descobrir isso é um caminho para encontramos o nosso princípio e fundamento em que “O ser humano é criado para louvar, reverenciar e servir a Deus nosso Senhor, e assim salvar-se” (EE 23.2). Ao olhar para nós mesmos, enxergar o outro e a criação, encontramos a forma perfeita de seguir a Deus e atingir o pelo qual fomos criados (EE 23.3).
Esse discernimento não é estático, mas vigoroso, dinâmico e reflete o mandato de Cristo “Vigiai, portanto, porque não sabeis em que dia vem nosso Senhor”(Mt 24,42). Vigilância que nos coloca no seguimento de Jesus, refletindo sobre os seus passos e assim, o descobrindo em nosso próprio caminhar, em nossa própria realidade de vida, enquanto aguardamos a sua segunda vinda. Entretanto, não se trata de uma vigília apenas de oração, mas de consciência, de zelo. Para isso, necessitamos agir diariamente, desde pequenos gestos que testemunham o Deus da vida, que deseja vida para todos e tudo.
Na Carta Encíclica Laudato Si’, sobre o cuidado da casa comum, Papa Francisco declara a importância de vivermos uma ecologia na vida cotidiana, que não se volte somente a plantar uma árvore ou proteger os animais, mas que envolva também nossos ambientes urbanos. “É preciso cuidar dos espaços comuns” (LS, 151). Somos chamados, então, como vocacionados e vocacionadas do Pai, a cuidar de nossa casa comum, tornando nossas ações uma oração a Deus, em que possamos mudar consciências,, derrubar muros – existenciais, sociais e reais – e abraçar o que se acha afastado, na beira do caminho. Expandir nossa espiritualidade ecológica e do cuidado, é se colocar a serviço de um Jesus que está presente no agora, no rosto dos mais pobres, dos famintos, de homens, mulheres e crianças e no grito de socorro de toda criação.
Cuidar da casa comum vivendo uma ecologia integral é forma de resgatar a dignidade humana, por meio da proteção dos nossos bens ecológicos tão importantes para nossa sobrevivência. “Laudato Si’, mi Signore” – Louvado seja meu Senhor (LS, 1), para que, seguindo os passos de Jesus, possamos ser guardiões da criação e do bem comum para todos os seres humanos.